sexta-feira, 2 de setembro de 2011

aquilo que chamam amor


O amor tem um jeito absurdo de entrar na vida da gente. Como aquele vento que antecede uma tormenta e entra em casa batendo janelas e derrubando o que está pela frente. Ele surpreende, ele te coloca em uma nova posição e te faz argumentar de forma completamente diferente as teorias antes desenvolvidas. Teorias? O que elas significam agora que a vida te colocou em frente a alguém que te seduz, verdadeiramente, pelo que é? Que te arranca o sorriso mais escancarado, assustadoramente sincronizado com o brilho que teus olhos lançam em direção àquela pessoa que até pouco tempo era um transeunte qualquer, numa rua qualquer, em um dia qualquer? Será que eu teria esbarrado em ti e sentido tudo isso há anos atrás?


Sabemos que não. O amor exige essa alquimia complexa, a combinação de tempo certo, química, pele, admiração desinteressada e desinfluenciada com uma pitada subjetiva e inexplicável de acaso. Além de todo esse lado emocional, a fórmula também requer ingredientes racionais. Ser parecido em valores, em objetivos de vida, gostar de programas parecidos e também ter diferenças saudavelmente posicionadas. Sim, as diferenças garantem a nossa individualidade. São a nossa ilha deserta para nós mesmos, porque todos precisam se curtir, se amar, sem precisar necessariamente ter alguém ao lado.


E os clichês começam a se confirmar. E você, que pensava que viveria muito bem uma vida solteira, rodeada de amigos e planos bem estruturados, e que estava verdadeiramente enxergando felicidade nessa possibilidade, sente instantaneamente que a vida pode ser bem melhor se você a dividir com alguém. Com aquele alguém, em especial. E o encanto todo dessa decisão é sentir que essa pessoa não está ali para completar você ou o espaço que antes estava vazio e só seria preenchido por alguém idealizado. Estar com essa pessoa é uma escolha. É um caminho que você quis seguir. Não porque não existiam outros, não porque suas pernas só agüentem aquele caminho, mas porque a vida fica bem mais colorida, feliz, segura e encantada, compartilhando seus momentos com alguém que, simplesmente, vale a pena.



“es contigo mi vida con quien puedo sentir que merece la pena vivir” Julieta Venegas - El Presente

segunda-feira, 25 de julho de 2011

e a receita era uma dose de rotina diária até o fim de seus dias


Quando criança eu pensava em desafios sofisticados, extremos, taquicardias, separações, euforias ou momentos de pânico transbordante. Eu acreditava que isso seria o mais difícil de superar, ou seja, o que é obviamente difícil de ser superado: morte, demissão, uma gravidez inesperada, uma puxada de tapete. Mas daí a vida te mostra que o que realmente faz o ser humano definhar é o que vem aos poucos. Lidar com a rotina é o desafio maior. Não meus amigos, eu não estou tirando aqui o peso das agruras da vida acima mencionadas. Elas realmente sacodem nossas estruturas. Mas lidar com elas no trivial do dia é o pior. Digerir o fim de um relacionamento nos anos subsequentes ao do dia do fim faz a data parecer algo pequeno. Superar a falta de um ente querido nas datas comemorativas que virão em família é mais dolorido do que a hora do enterro. Esse veneninho em conta gotas é o mais difícil de encarar. É o que mais arde na pele.

Assim como a rotina de controle diária a que um ser humano é submetido. E, muito importante, a rotina que um dia, aceitamos nos submeter. Não lembro de ter assinado nenhum contrato prévio com essas cláusulas, nem de terem me questionado se eu queria uma vida assim. Tenho quase certeza que teria escolhido aquele pacote da vida excêntrica de uma repórter de uma revista de turismo que precisa escrever sobre cada um dos dias que passa em diferentes partes do mundo. Ou o da nativa das ilhas do oceano índico, em contato com a natureza e num mundo bem menos capitalista. Uma marroquina super espiritualizada e apegada às suas tradições. Mas não vamos nos enganar, não é mesmo? Eu estaria reclamando de solidão no primeiro caso, alienação no segundo e opressão no terceiro.

Ou seja: o grande desafio é justamente esse. Conseguir ser feliz nas possibilidades que existem. Fazer essa tarefa diária de contrabalançar os pesos da vontade e das exigências que precisamos cumprir com nós mesmos. Sair da cama num dia de inverno, às 6h30min para ir na academia, dia após dia e criar essa disciplina. Comer o correto, comprar o que cabe no orçamento, poupar para o futuro, ter sonhos reais...

E mais uma vez, cá estou eu, repetindo o óbvio para garantir que ele não seja uma fase, mas uma realidade na minha vida. E haja anos de amadurecimento! A única certeza, é que o tempo faz muito bem àqueles que estão sempre abertos e dispostos a ser melhores (é claro que, quando falo “melhores” me refiro ao melhor dentro da realidade de cada um, não mirando a flecha no inatingível e vivendo da angústia de nunca chegar lá). E esse tema do inatingível já rende mais umas boas laudas de conversa com o editor de texto...

segunda-feira, 18 de abril de 2011

adolescer


Quem não adolesceu fora do tempo ou de contexto, uma vez na vida, que atire a primeira pedra. Que faça a primeira crítica. Mas isso pode ter acontecido durante alguns segundos, em que você deixou de ter a responsabilidade que adquiriu em anos. Em uma birra descompromissada, ou quando fingiu ser um super-herói na vida real. E daí, já adolesceu? Pense, com certeza você já fez isso fora da faixa etária permitida para se agir de forma inconseqüente.

E se é pra falar, eu confesso: eu adolesci e tenho adolescido. E sabe que não tira pedaço e é um exercício construtivo? E o melhor: poder adolescer quando já se é maduro (entenda, os atos adolescentes aqui são um estado, o amadurecimento é um fato) faz a curtição ser uma coisa bem diferente. Existe uma segurança e um entendimento absurdo. Tu anda de mãos com teu superego e estabelece um diálogo tranqüilo, ao contrário de fugir e se esconder desse moço chato que tem o papel de toda hora relembrar das (in) conseqüências de teus atos.

Costumo agradecer à censura de minha mãe na maioria das vezes que ela foi meu superego quando eu era realmente, um ser adolescente. Mesmo tendo contribuído pela minha transformação em uma adulta um tanto medrosa e desconfiada, hoje vejo que ela fez muito certo. Criança e adolescente tem mais é que respeitar ordens. Seguir o trilho que ensinam. Essa coisa de que “pagam as tuas contas” e tu “nem sabe se limpar” é verdadeira. Como deixar um projeto de gente sair dando cartadas sem conhecer as regras do jogo?

Mas repressão, todo mundo sabe, não é o caminho. Se dar liberdade demais na hora de agir é ruim, dar liberdade e acesso ao conhecimento é bom demais! Não é preciso sair experimentando tudo sem preparo. Ler, perguntar, conhecer pessoas que já passaram por aquela situação, isso sim. Essa liberdade dá a capacidade de saber realmente, a hora de tentar. Entendam, não estou aqui dizendo que a gente se arrepende do que faz e que as vivências não são necessárias. Mas vivência com consciência é inteligência. Aquela máxima que diz que a gente só aprende levando na cara é verdadeira em parte, a meu ver. Eu acho que quem dá a cara à tapa demais é burro.

E daí tu vê as inconseqüências. Gente adulta que, de tanto se atirar na vida, acostuma a apanhar. E confunde coragem com imprudência. E tentativa com persistência no erro. Ser medrosa, não. Ser cautelosa, sim. Escolher em que briga entrar. Eu escolho meus adversários e me preparo pra luta. Não gosto de levar porrada de graça.

É esse adolescer maduro que a gente se permite ter. Uma atitude criançóide aqui, uma inconseqüência acolá. Pelo prazer do tentar só depois do saber, pela experiência de viver uma coisa nova sem se lanhar toda num chão de concreto. É ser trapezista com rede de segurança. E confesso gente, o prazer é ainda mais intenso quando somos seguros de quem somos.

terça-feira, 5 de abril de 2011

pensar e pesar

Coração acelerado há dias. Ele anda a galope dentro de mim. Olha pro lado, olha pra dentro e não sabe o que faz. Duas letras infames dançam suspensas por fios de nylon no meu estômago. Um “s” e um “e”. E se? E se você fizer errado? E se o outro caminho for melhor? E se você nunca descobrir o que tinha lá embaixo do buraco?

Enquanto foliões bebiam e se acabavam nas ruas e nos clubes, eu tive um Carnaval sem serpentina e confete. Eu tive dúvidas, eu analisei critérios exaustivamente. Porque disso depende a nossa vida. De nossas escolhas. Tentei jogá-las para onde pude. Questionei amigos, pessoas mais velhas, pai e mãe. Como uma boa jornalista ouvi diversas opiniões. E fiz a minha matéria expositiva. Esse vício de buscar a imparcialidade me torna um ser que caminha em cima do muro, mas que sente ímpetos de se atirar a todo o momento. Lançar-me ao novo é sempre um movimento mais natural do que o de permanecer. Só que antes de se jogar é preciso pensar e pesar. E isso é sempre penoso.

Aí é a hora da gente dizer aquela frase apaziguadora dos ânimos internos “O que tiver que ser vai ser”. A gente sempre “entrega a Deus” ou ao destino, a inevitabilidade dos fatos, o próximo passo. É como se livrar, sem receber a alcunha de covarde, é como não se responsabilizar pela conseqüência. Uma vez disse isso e recebi uma resposta rápida: “Não Clarissa, era para ser, para mim não existe. As coisas podem ser, porque construímos a possibilidade de serem, não concorda?” Sim, concordo. Mas não sou um ser cético e adoro pensar que há em nós, seres humanos, alguns fios de nylon (mais uma vez eles) e forças superiores que nos jogam para certos lugares. E mais uma vez, subo naquele muro. Não consigo ter uma opinião certeira. Odeio certo e errado, sim ou não. Prefiro dizer que, em se tratando de vida, há inúmeras forças agindo e nós somos o resultado daquelas em que acreditamos.

domingo, 13 de março de 2011

(des)caminhos


Relacionamento amoroso é uma loteria. É preciso conhecer superficialmente alguém e acreditar que o outro tem o perfil capaz de te cativar. Se essa análise básica é positiva, o próximo passo é a aproximação. Química, beijo, papo...quais são seus sonhos? Família, amigos...como você vê o mundo? Procurar algo perfeito não, somos já adultos para saber que perfeição cansa. Mas o balanço precisa ser positivo até aí. E então, teoricamente, se vai em frente.

Inexplicavelmente, muitas vezes o que tinha tudo para dar certo não dá. E daí suas amigas lançarão mil argumentos para justificar a sua falta de interesse ou a dele. Mas o que não vemos, muitas vezes, é que a simples falta de interesse já é a chave de tudo. Ok, a pessoa é legal, justa, se sustenta, é maior de idade, tem os ossos no lugar, um olhar confiável (até que se prove o contrário). Mas ela não te inspira vontade de continuar o reconhecimento.

O ser humano é um campo minado. E é exatamente esse não-saber-o-que-se-vai-encontrar que nos faz conhecer alguém para amar. Só a curiosidade nos faz percorrer mais alguns passos dentro de alguém novo. Ou ficaremos satisfeitos por ter admirado a fachada.

E se existe o fator curiosidade, você vai entrar, vai querer ver mais uma vez, vai ficar pensando durante todo o trajeto pro trabalho por que diabos ele reagiu daquela forma ontem no jantar. Quando conhecemos tudo, quando já entramos nos quartos mais íntimos, admiramos os objetos mais pessoais e até aqueles trancados com chave, a curiosidade pode passar. Quando o território já é totalmente conhecido, o que mais podemos explorar?

Mas conhecimento em excesso não é sinal de falta de interesse. E o que dizer daqueles lugares que gostamos de voltar ou que nos habituamos com o cheiro, a cor, o visual e as sensações que nos trazem? Sim, existem lugares e pessoas em que queremos permanecer. E a química que define se vamos nos seduzir pelo conhecido ou simplesmente querer descartá-lo é, mais uma vez, obra da inexatidão. Não há como prever os passos seguintes.

De mistérios nos guiamos e nos descobrimos. Desconhecer o conhecido, surpreender-se com o que pensávamos que era de nosso domínio. E, lembre-se, não há como querer ser novidade para alguém. É um movimento natural. Se não me instigas a vontade de caminhar por dentro de ti, continuarás sendo um caminho. Nem bom, nem mau. Apenas seguirei e seguirás naqueles que te encantarem mais, te mostrarem coisas novas, te seduzirem a caminhar mais e mais.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

monólogo


Eu sei que sempre estás aqui e sabes de tudo que se passa. Não preciso, portanto, fazer um relatório dos fatos ou te contextualizar da conjuntura. É, falo de sentimentos. Não das praticidades que tu já estás cansada, da rotina que compartilhamos há alguns anos, alguns anos chatos. Me parecem chatos agora. Cansativos.

Advirto que não estou dosando as palavras para me dirigir a ti. Estou querendo ser navalha mesmo. E peço o obséquio de deixares o sangue escorrer.

Trata-se de tua mania de andar em círculos. Além de ser improdutivo, receio estar nauseada desses teus movimentos. Onde está aquela nossa mania diferente de viver a vida? Onde estão os desafios que nos propusemos a lançar e viver juntas? Tudo parece um grande nada e até os lugares que um dia pensamos serem os melhores destinos de nossas fugas parecem o mesmo nada. Um grande vão que não leva a lugar nenhum. Um grande vão em vão.

Sempre tive esse jeito escandaloso de te mostrar a vida, mas tua parte em nosso trato era encontrar novos caminhos e soluções, tornar práticos e reais nossos sonhos. Não vejo mais atitude em teu pensar. Estamos imersas em uma água morna. Estranhamente e desgostosamente estável. Queria fazer um turbilhão, mas sem tua ajuda, tudo fica muito intimista. Grito aqui sozinha, te coloco algumas lágrimas nos olhos, mas tu me olhas com cara de criança incompreendida. Estou fazendo a minha parte, a parte que julgamos juntas, ser a minha missão nessa empreitada.

E escrevo esta que lês em posição de cobrança. E olhe bem, nós duas, antes tão íntimas, agora precisamos de formalidades para nos dirigir uma a outra. Passou aquele tempo em que existia diálogo e consenso? Onde eu dava sinais e tu interpretavas intuitivamente? Eras bem melhor, muito melhor...ou me acostumei a enxergar com uma anti-lupa teus progressos. Ou, simplesmente, esperamos demais uma da outra.